Resenha | Sonho febril - George R. R. Martin

Ficha técnica

Título: Sonho febril

Autor: George R. R. Martin

Tradutor: Luis  Reyes Gil

Editora: LeYa / Edição: 2015 (livro de 1982)

Páginas: 368 / Capítulos: 35

Lido em: junho/2020 a 25/04/2021

Aviso: Essa resenha pode conter SPOILER

Em abril de 1857, Abner Marsh não estava vivendo o melhor dos seus dias. Dono de uma compahia de barcos a vapor - a Companhia  Fevre de Vapores Fluviais -, o velho capitão havia perdido boa parte da sua frota naquele inverno e lhe restava apeanas a pequena e decadente Eli Reynolds, após um inverno cruel em Saint Louis. Com problemas financeiros, ele recebe uma oferta boa demais para ser recusada: fazer uma sociedade com Joshua York, um desconhecido com dinheiro e nenhum conhecimento sobre o rio.

Assim, com as ideias e conhecimentos técnicos de Abner, e o dinheiro e desapego de Joshua, nasce a majestosa Fevre Dream. Abner deseja não apenas retornar para os negócios, mas também transforma-la na maior e mais rápida embarcação do rio Mississipi.

O maior obstáculo, no entanto, é o próprio Joshua que insiste em fazer longas e misteriosas paradas noturnas em cada porto do rio. Quando Abner assinou o contrato de sociedade, ele sabia uma coisa sobre Joshua e seus amigos: eles eram estranhos, de hábitos noturnos e a única regra que devia seguir era nunca se meter nos negócios deles. Mas as paradas frequentes e os sumiços de Joshua começam a irritar tanto o capitão, que ele está disposto a quebrar a confiança de seu sócio e investiga-lo por conta própria. E o que ele descobre está muito além de qualquer coisa que ele poderia ter imaginado.

Joshua York é um vampiro! Mais ou menos...

George R. R. Martin faz uma pequena subversão no gênero de vampiros apresentando criaturas que carregam muito da mitologia já conhecida, mas com características próprias. Não, eles não brilham, nem são "vegetarianos". A primeira coisa é que eles não se autodenominam vampiros. Segundo Joshua, essa e outras denominações são criações humanas, em lendas de diferentes lugares. Eles próprios preferem o termo Povo da Noite. Eles não são humanos mortos-vivos, nem foram transformados. Eles são uma raça de imortais, com hábitos noturnos e que caçam humanos para se alimentar. Eles podem se reproduzir e têm poderes hipinóticos ou psíquicos (não entendi muito bem) que os ajudam a não somente controlar a preza, mas também manter a hierarquia em um grupo, através da figura de um Mestre de sangue, o líder.

Joshua é uma criatura centenária que dedicou sua vida a buscar uma espécie de "cura" para a necessidade de seu povo de se alimentar do sangue humano. Isso porque por muitos anos ele conviveu com o povo do dia, como ele chama, e acabou desenvolvendo muito respeito e admiração por eles. Joshua explica para Abner que seu povo de tempos em tempos passa por uma "febre" que é quando eles precisam beber o sangue humano. Em suas pesquisas e testes, ele acabou criando uma bebida que atende às necessidades deles, e permite que as duas espécies possam finalmente conviver em harmonia.

Porém, quando ele apresenta a ideia a outros vampiros (vou usar esse termo por ser mais prático), nem todo mundo concorda com sua visão utópica. Algumas criaturas simplesmente estão conformadas com a maneira como as coisas são. E Joshua vai descobrir que convencer aqueles de seu povo que vivem nas margens do Rio Mississipi não vai ser uma tarefa fácil.

Por quase a maior parte do livro, Martin parece mais interessado em nos ensinar sobre o funcionamento dos barcos a vapor e dar uma aula de história americana, através de longas descrições sobre o comércio nos rios. O que deixa de ser interessante bem rápido. Especialmente depois que você descobre sobre a verdadeira natureza de Joshua e sua missão. Você quer saber mais sobre isso e não sobre as cidades ribeirinhas e outros capitães.

Felizmente, porém, de quando em quando o autor muda o ponto de vista e mostra o que está acontecendo com Sour Billy Thopson. Assim como Abner, ele é um humano, mas seu maior desejo é ser "transformado" em vampiro. Por isso, ele segue e obedece a todas as ordens de Damian Julian e seu grupo que também fazem parte do Povo da noite.  Sour Billy é um homem detestável e orgulhoso, que vê em seu "trabalho" uma chance de conquistar a vida eterna. Ele não poupa esforços para agradar Damian e age como os olhos de seu mestre durante o dia. Esse núcleo é - na falta de palavra melhor - desagradável. O que é um grande acerto da narrativa, por mais que as cenas descritas por Martin sejam bem difíceis de digerir. Eles não têm qualquer limitação moral.

Enfim... o livro é eficiente para quem quer uma leitura de terror descompromissada, mas vai ter que passar por longos trechos sobre o comércio em barcos a vapor ao longo de New Orleans, Mississipi e Ohio. Quando a história começa a andar, já foi metade do livro e é você quem decide se vale a pena seguir em frente.